Elsa Neves
O fazer do escultor, o já contido que surge da pedra bruta cortada, as insistências, o trivial do encontro entre pedras e perdas e o que é irredutível ressoam no caminho de uma análise. É o que encontraremos ecoando no texto de Marcelo Veras: “Entre perdas e pedras, o caminho de uma análise”, texto que nos convoca à pedra e à perda em feitio de poema.
O tema das XXXI Jornadas Clínicas, “A palavra e a pedra: interpretação em análise”, convida a situar a interpretação em análise. O que se destaca no texto de Marcelo Veras é o entre no título que aponta para um caminho possível. O que no caminho de uma análise pode recortar, contornar pedras e consentir nas perdas que abram para um fazer poético, singular?
Marcelo Veras lembra Da Vinci que inspirou Freud para situar o analista na posição do escultor que trabalha na “via di levare”, como o que corta a pedra para fazer surgir o que a pedra bruta já continha. Os cortes que a esculpem deixam escultura e restos. Restos de pedra, de perda podem, entretanto, ressoar, repercutir, apesar de sua insistência em ser pedra.
O que o texto de Marcelo ilumina é o fazer do analista-escultor: cortar para fazer surgir o já esculpido, não sem deixar restos que continuam repercutindo e que orientam o caminho de uma análise.
João Cabral, Drummond e Wislawa Szymborska mostram que se pode fazer poesia com pedras corriqueiras, insistentes e que falam.
Em “Catar feijão”, a pedra é trivial, não deixa de ser encontrada no feijão, mas pode ser separada, como nos diz João: “[…] pois, para catar esse feijão, soprar nele,/ e jogar fora o leve e o oco, palha e eco”. No caminho da análise, não são as pedras triviais? Não se joga fora a palha, o eco e o oco?
Drummond, com seu poema tão famoso, nos dá a pedra que insiste em não sair do caminho, perda que é pedra, porque não pode ser recuperada, mas que o poema permite contornar com palavras. Marcelo Veras aponta nessa perda e na pedra o caminho para todo analisante.
“Conversando com a pedra”, outro poema em que reverbera o tema das próximas Jornadas, o que Marcelo Veras destaca é justamente que as pedras falam, “mas continuam hermeticamente fechadas” e testemunham o “impossível que o fim da análise nos reserva”. O poema de Wislawa conclui a conversa com a pedra, que fala, mas continua hermeticamente fechada: “– Não tenho porta – diz a pedra.”
O texto de Marcelo é um convite mais que precioso para orientar o trabalho de escultor do analista.
As Jornadas Clínicas são um convite para que as pedras que inspiram trabalhos clínicos possam conversar nas XXXI Jornadas. Os trabalhos dos analistas construirão propostas para as conversações dessas Jornadas. Convidamos, então, para que inscrevam seus trabalhos. Leia na íntegra a chamada e as normas enviadas pela nossa Comissão Científica.
Acompanhem as XXXI Jornadas Clínicas
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