Marcia Zucchi
É com alegria que participo de mais esse lançamento das Jornadas da EBP-Rio e ICP-RJ. Já foram muitos… Mas a cada vez é uma surpresa, seja pelas questões que abordamos, seja pela forma como as coisas vão tomando corpo, seja pelas ressonâncias do tema na nossa comunidade e mesmo fora dela. Depois de um percurso – três Jornadas [Exílios / Lógicas Coletivas nos tempos que correm/ Ilusões, nas loucuras, no amor e nos discursos] – onde trouxemos para o campo da psicanálise temas candentes na vida social; retomamos a nossa rota com algo muito próprio à clínica psicanalítica: a interpretação. Mas aqui a interpretação é proposta a ser pensada na sua íntima relação com o que da palavra, cria e dissolve pedras, nos corpos e nos discursos.
Vocês verão no Argumento e nos eixos que esta proposta se centra no intervalo entre os corpos e o discurso, que por vezes se petrificam, especialmente como efeito do discurso do mestre, e onde o analista, com a interpretação, entra para manter aberta a hiância entre eles.
Mas por que é preciso manter esse intervalo entre o corpo, por vezes petrificado, e os discursos? O que circula por aí que é tão vital para o falante? Talvez na pergunta esteja a resposta: o vital da pulsão, o que por ficar fora da simbolização insiste pedindo palavras. E assim vamos vivendo… de amor, como o de transferência, que é basicamente tecido com palavras, mas não sem suas pedreiras…
Há muitas vertentes em que o tema destas Jornadas pode ser abordado e elas estão apontadas no belo Argumento e nos 3 eixos temáticos.
A expressão “interpretação em análise” aporta um equívoco do sentido que aponta não só o valor instrumental da interpretação em psicanálise, mas a importância e a potência deste instrumento para abordar as questões que nos demandam uma clínica hoje. A proposta da Comissão Científica bem como da Coordenação destas Jornadas é que: “submetamos a interpretação à análise, discutindo seu lugar diante dos discursos dominantes no laço social.”
Despetrificar , despedrar. Despetra, esse será o nome do boletim destas Jornadas. O nome me agrada não só pelo sentido do termo que aponta para uma fluidificação, mas também por sua homofonia com o Diz-pedra. Uma analogia com o dito de Michelangelo após terminar seu Moisés que, segundo os historiadores, surpreso com o realismo e a força de sua obra, o faz exclamar: Adesso Parla! Agora Fala! Diz-pedra! Mas em oposição ao sentido em que a pedra assume nesse exemplo – como reprodução exata da realidade – me agrada a ideia de que o falante diante do real que é pedra só possa se dizer: Agora Fala!
Convido a todas e todos, em especial aos alunos do ICP e aos participantes dos Núcleos de pesquisa, a se debruçarem sobre a questão da interpretação, tão central em nossa prática clínica, ao mesmo tempo que de tão difícil definição! De onde ela provém? Quem interpreta? Ela é calculável? Se pode ensinar a interpretar em psicanálise? Essas são apenas algumas das questões em torno desse tema.
Aproveito para a agradecer a parceria sempre muito produtiva com a EBP-Rio, através de sua Diretora, Maria Inês Lamy, às coordenadoras das próximas Jornadas, Isabel do Rêgo Barros e Ana Beatriz Zimmermann, pelo excelente e animado trabalho até aqui, e a todas as Comissões que vêm trabalhando com muito entusiasmo e que vocês conhecerão já, já.
Aguardamos os trabalhos de vocês que podem ser fruto de cartéis, mas não só. Os cartéis fulgurantes são um ótimo meio de estudo e depósito do saber e das dúvidas construídas. Pequenas pedras que ora colocamos, ora retiramos do caminho.
Lancemo-nos, então, ao trabalho!